Abismo

Eu ando e vou pisando meus ideais, meus sonhos e tudo que vai tornando-se pó, parte do que já se encontrava ali. Como eu pude deixar, talvez até te matar em mim? Fechei os olhos para o que me pareceu íngreme, mas certo e me deixei levar pela mão, para as delícias enganadoras, como folha ao vento, sem resistir... Eu me tornei mais uma em meio a multidão, talvez quisesse provar do gosto do mundo e de tudo aquilo que ele apresenta de tentador. E assim estive por longo tempo, sem me tocar; quando precisei e pedi, me destes, quando tive medo, me acalmaste, e nenhuma palavra de gratidão te dei em troca, no meu mudo prazer. No fundo de mim e daquele abismo que me abocanha eu queria algo mais, naquele paraíso da perdição não tinha tudo, a sensação mesmo que boa, sempre se esvaía; e busquei desesperadamente o que nem eu sabia ser. Nessa busca incessante eu me tornava cada vez mais vazia, aos poucos fui deixando de lado aquelas pessoas que me sugavam a alma, vaguei pela noite sem destino, e mais negra ainda era minha dor. A certeza de que encontraria o que buscava foi quem me impeliu a continuar. Já não sabia onde me encontrava, as pessoas antes me adulavam, hoje me cospem e chutam, agora nômade numa terra sem riqueza, tal qual flecha sem alvo, me tornei o avesso daquilo que um dia idolatrei, afundada no pântano, pisei cadáveres, me encharquei no mar de sangue e vísceras, minhas mãos já não sentiam, meus olhos pouco distinguiam à minha frente, já não ouvia os rumores ruidosos do mundo dos vivos, apenas o gemer do meu subconsciente, uma súplica. A brisa me fustiga tal qual tormenta, os pingos da chuva me queimam, a terra me congela e o sol já não vejo, nem a lua, as estrelas, os dias passam, sem que possa perceber, tudo me castiga, até o simples respirar, a vida. E no momento em que senti me desligar de mim, fui afundando, em vão tentando me agarrar em alguma borda, mas minhas forças me traíram e meu corpo fraco resvalou abismo abaixo; me suspendestes e num rasgo de esforço eu vi um círculo se obturando acima de mim, algumas estrelas, a lua... O sol veio, forte e amarelo, majestoso; eu caía... Gritei e minha voz saiu, ferindo meus ouvidos, implorei socorro, piedade, nada. Agora eu precisava e ninguém me escutava, fui orgulhosa, covarde demais para admitir que errei, mas sei que não se é tarde pra pedir perdão... E vou caindo, a um lugar que não leva a lugar algum, e tento gritar de novo, mas já não tenho voz de novo, e com um suspiro olho uma última vez tudo aquilo que desperdicei e manchei minha alma, por pura curiosidade e sensualidade, sou tão pequenina quanto um grão de areia, que cheguei a ser desprezível até a mim mesma, agora é lua cheia...”Perdão!”

Lilian Holmes
 

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